quinta-feira, 26 de março de 2015

Você Constrói a Democracia - Entrevista Jornal - O Nacional

Entrevista concedida para o Jornal - O Nacional:


Diante de um momento de ânimos conturbados no sistema político é necessário refletir qual a postura que cada cidadão adota no cenário democrático. Sejam eles, nos processos de tomada de decisão e, principalmente, nos espaços de participação que auxiliam e, muitas vezes, colaboram para a atuação das instituições representativas. É importante lembrar que a democracia é recente e está em plena construção no país. Com 25 anos de prática tanto as instituições como a população estão aprendendo como atuar e lidar com ela. 

O especialista em direito constitucional, André Leandro Barbi Souza, destaca que com o fim da Ditadura Militar, o Brasil saiu de um sistema de centralização do poder, onde as leis eram criadas e direcionadas para o povo sem discuti-las com os entes envolvidos. “A constituição surgiu a partir da intenção de romper com esta realidade”. Para ele, manifestações, contestações e contrapontos de ideias são aspectos naturais do contexto. “Mas para a construção da democracia é fundamental ter serenidade para compreender suas transformações até chegar a estabilidade”. 

Dessa forma, a sociedade pode e deve atuar na tomada de decisões, mas é importante lembrar que os espaços políticos partidários e eleitorais não são as únicas esferas capazes de demonstrar a vontade popular. O sociólogo Ivan Dourado destaca que a sociedade possui uma ampla gama que viabiliza a tomada de decisões, as discussões e estudos diante das demandas que envolvem o contexto social. As esferas comunitárias, os espaços educacionais, movimentos sociais, entidades de classe, sindicatos, audiências públicas, conselhos municipais e em diversas outras organizações são áreas que possibilitam a interação. A sociedade, por exemplo, pode acompanhar as sessões da Câmara de Vereadores, participar de projetos de Lei de iniciativa popular, realizar indicações ao governo municipal. Caso nenhum desses espaços contemplem seu ponto de vista, o sistema permite a possibilidade de criação de novos movimentos ou organizações que atendam as demandas.

Porém, poucas pessoas aproveitam ou se identificam com esses espaços e, na maior parte das vezes, não há renovação das figuras que participam desses segmentos. Mas esse não é o aspecto mais relevante, segundo Dourado. Segundo ele, não basta apenas mudar as pessoas, se as lógicas de funcionamento são antigas e cheias de problemas e contradições. “Isso está relacionado com o nosso passado de Ditadura Militar que deixou um "vácuo" de mais de vinte anos, onde não se viveu a política e todas as possibilidades de luta e critica foram proibidas, sobrando apenas algumas entidades de interesse com aparência de serem democráticas”. Ele explica que faltam espaços que abriguem as novas gerações e possibilitem o pensamento democrático e político. “A população não possui vivências e muito menos experiências individuais de democracia, tirando a época das eleições, ainda são minoria em nosso país quem participa ativamente de espaços democráticos visando o bem coletivo”.

Cultura política. O Brasil está imerso no mais longo período contínuo da democracia. Mas ainda não há espaços capazes de impulsionarem uma cultura política participativa. Dourado, questiona quais os espaços que direcionam a população a se posicionar como um agente político. “onde aprendemos a participar? Quais são as instituições publicas ou privadas que ensinam as possibilidades de uma participação democrática?”. Segundo ele, os jovens são educados para o trabalho, mas não são formados para serem cidadãos atuantes. Dessa forma, ressalta a necessidade de buscar espaços sociais de descobertas do protagonismo político de todos. “Seria importante superar esse modelo de representação atual de nossa democracia, e construir espaços mais efetivos, para que sejamos inseridos desde cedo em um contexto onde ser cidadão significa mais que um direito e dever, mas uma experiência carregada de sentido democrático, desde os primeiros anos de vida”.
21/03/2015 - 08:00 , por Cássia Paula Colla onacional@onacional.com.br