Para começar, somos a geração formada pela opinião copiada dos outros e
na defesa da solução fácil. Uma geração que assistiu nos últimos 15 anos,
programas policiais do tipo: “Aqui e agora“; “cidade Alerta”; “Balanço Geral”,
“Polícia 24 horas” e cresceu acreditando que tudo o que acontece na televisão e
no rádio é o mesmo que acontece o tempo todo nas ruas. Descobrimos que no nosso
jornal diário tem mais espaço para a página policial que para as notícias do
mundo. Qual o resultado disso? Acreditamos na Redução da Maioridade Penal (e
até pena-de-morte), defendendo essas ideias como solução para a violência do
Brasil. Mas qual o motivo de acreditarmos em soluções assim? Como aprendemos a
acreditar que o criminoso “escolheu” o caminho do crime e deve ser punido e que
se com 16 anos já se pode votar, também pode ser responsabilizado já que “escolheu”
matar?
Essa forma de pensamento e opinião não é
NADA ORIGINAL. Essa visão de mundo é altamente SIMPLISTA e ABSURDA e você
aprendeu a ver o mundo desta forma por um jornalista ou alguém que te repassou
e você acreditou. Essa opinião é originalmente compartilhada pelos jornalistas
policiais que ganham a vida divulgando noticia
de morte, estupro e troca de tiros. Casos como do Datena, Motta, Bogado são
alguns dos nomes mais atuais. Jornalistas policiais que precisam
transformar o crime em sensação para se manter com audiência
alta. Sensação de que? Sensação de insegurança, onde o crime está em toda a
parte e que o cidadão tem que comprar uma arma para se defender e que os
menores estão matando e estuprando e ficam impunes. Assim, com essa visão de
mundo, as pessoas entram no embalo e repetem o argumento, repassando para seus
filhos e amigos, pois afinal: “o crime venceu”.
Meu objetivo será mostrar por argumentos Sociológicos
o quanto a REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL é uma SOLUÇÃO FALSA. Pois ela não irá
alterar nenhuma das questões apontadas e o mais grave, tende a piorar a
realidade do crime no Brasil. A Redução é vingança e não solução.
Pretendo começar a falar sobre as cadeias
brasileiras. O nosso atual sistema carcerário está dominado pelo PCC, CV e
organizações criminosas que constroem alianças de proteção dos seus membros no
interior dos presídios. Porém, após cumprir a pena, o preso tem que pagar essa
proteção dando dinheiro mensal para a facção. Para não morrer ou ser estuprado
na cadeia ele entra numa facção criminosa e contrai uma divida eterna, tendo
que pagar pelo resto da vida um “apoio mensal para os irmãos” e na maioria das
vezes, acaba voltando a roubar e a matar para manter a palavra e não ser morto
ou deixar matarem alguém da sua família. Neste caso, imaginem um menino de 16
anos (mas poderia ser 14, ou até 12 anos como existe em alguns países),
entrando neste ciclo do crime desde cedo. Sem falar que ele estaria cercado por
criminosos com larga experiência no crime. E a cadeia, é solução ou é vingança?
Pois ressocializar ela não ressocializa. Na última estimativa dos juízes no
Brasil, a reincidência é de 70%. Ou
seja, prender menores com adultos é absurdo em todos os sentidos.
Mas e o argumento de que o jovem fez uma
escolha: “Ele matou porque quis, fez a escolha do crime e tem que pagar”. Você
já se perguntou por que a grande maioria dos presos são também pobres e não tem
estudo? Nunca se perguntou isso?
Os estudos sobre a desigualdade e
violência do Brasil apontam que quem nasce sem ter acesso à educação, saúde e
dignidade, tem maior chance de experimentar a vida do crime. Pais que não
estudaram, ou não tiveram chance de estudar, sem exemplos próximos para
incentivar ao estudo ou a leitura, vivendo em péssimas condições de vida e
alimentação, em meio a uma realidade de miséria e sem exemplos de pessoas que
estudaram e melhoraram de vida: (É Neymar rico, Funkeiro que fica rico, etc).
Para quem vive em condições assim e com esses exemplos, depois do sonho do
futebol, o crime é um caminho. As armas e a violência estão na porta de casa
(Ou dentro de casa, inclusive com a polícia arrombando sua porta ou trocando
tiros com traficantes). Neste ambiente o crime é uma opção porque o jovem não vê
futuro. Seus familiares que trabalham honestamente vivem com salário mínimo. O
celular da propaganda ele só terá se trabalhar anos para pagar (se conseguir
pagar). Para esse jovem, o crime está convidando e flertando todo o dia com
ele, vendo colegas e vizinhos no crime com roupas, tênis e celulares da
propaganda. Será isso uma escolha? E mesmo assim, a MINORIA dos moradores de
comunidade, vilas e favelas comete crime. Escolhe a vida da miséria, mas honesta.
Mas nem todo mundo agüenta a vida de sobre-viver, e vai para o crime.
Se compararmos essa realidade com a
realidade de um jovem de classe média. Para esse jovem o caminho do crime será
a exceção e não é um flerte diário. Posso afirmar isso, pois na casa dele terá
exemplos, estimulo ao estudo e condições. A polícia não trocará tiros perto de
casa toda a semana, ele não verá amigos morrendo no tráfico e nem seus pais
subempregados e morando em barracos e sempre sem dinheiro ou faltando comida.
Terá sonhos de futuro que seus pais o ajudarão a ter e incentivar a conquistar.
Não te faltará comida e nem passagem para ir para a escola se mesmo assim você
escolher o crime, esse será a exceção, que AÍ SIM escolheu largar as chances e
oportunidades da vida para roubar ou matar. Isso sim é uma escolha, pois estará
largando outras chances. Mas essas realidades são INCOMPARÁVEIS. Dizer que
TODOS temos as mesmas chances é absurdo. Pois não temos, vivemos em um Brasil
MUITO desigual. Mas ser pobre é muito difícil e o crime é um caminho mais
próximo do pobre. E a Redução da Maioridade acabará punindo o jovem pobre.
Em TODOS os países onde se reduziu a
Maioridade Penal, os crimes não diminuíram, ou seja, o “bandido” não deixa de
roubar por medo de ser pego, independente da idade. Ele sempre se acha esperto
e acredita que não será pego nunca, principalmente os mais jovens, que acreditam
que são imortais e especiais. E para terminar, no Brasil, segundo pesquisa do
IBGE e confrontado com outras fontes de Pesquisa, os crimes violentos
envolvendo menores não passa de 2% no Brasil. Ou seja, estamos discutindo algo
que colocará o menor na cadeia comum por ter furtado uma carteira. Acreditar em
jornalista policial é cair na conversa de quem quer simplificar a violência.
Antes de defender a ideia dos outros, pesquise, leia e veja que a sociedade é
mais complexa que a opinião de quem quer curar o câncer com remédio para dor de
cabeça.
Ivan Dourado
No Brasil, o menor de idade já fica preso
em instituições para menores e com 18 anos ele recebe uma nova chance de viver
sua vida em liberdade. (Publicado originalmente na coluna Opinião do Jornal O Ponto da Notícia - 25 de Abril de 2015)