Não é de hoje que as músicas oriundas das classes menos favorecidas sofrem baixa aceitação pelas outras classes. Não precisamos voltar à todas as práticas advindas dos escravos e imigrantes no Brasil para exemplificar
(religiões afro, capoeira, etc), podemos falar de exemplos mais vividos atualmente como o samba, o pagode, o Funk e muito recentemente do Funk chamado de Ostentação.
Mas pelos lados de lá, ser
Gangsta é um termo mais amplo. A realidade dos guetos norte-americanos, de
bairros simples, com violência entre
gangues nas ruas, da policia e do racismo se tornam a-temporal. O clipe vira
algo a-histórico, assistir músicas antigas reforçam uma ideia de que nada mudou
por lá, e mudou?
Esse quadro dos guetos é combinado com a demonstração de poder
bélico, com armas e coletes que são combinados com um toque de ostentação
econômica: carros grandes, muito, mas muito ouro no copro e mulheres (dignas de
serem contratadas no Brasil como assistentes de palco) regadas à bebida da
moda, roupas e joias grandes, figurando como um tempero final na receita de ser
Gangsta Rap.
Já
no Brasil, ser ostentação é algo mais simples. O tempero de lá é o recheio do
bolo por aqui. Mas não vamos ser hipócritas, a ostentação que está nos clipes
de Funk, já era visível muito antes estão nos clipes dos Sertanejos, dos
sertanejos de universidade, dos Pagodeiros, das músicas eletronicamente
compostas por DJ´s e uma constante de ostentação marcante nos artistas da linha
POP. Ou estou falando alguma bobagem? (vejam essa reportagem)
O que talvez seja
novidade por aqui, e talvez aí esteja uma inovação misturada com uma certa
ingenuidade, é compor da letra até a produção do clipe, falando apenas do poder
do dinheiro: de comprar a tudo e a todos. Afinal, quem não está feliz rodeado
de tudo o que o dinheiro pode comprar? Mas note bem, estar feliz, é bem
diferente de ser feliz. Vejam esse crítica política sobre o Funk, pena que a mesma crítica não entra em outros estilos musicais:
O fenômeno da ostentação por parte dos mais pobres é um absurdo? Só para os que pensam como os ricos. Afinal, se “eles” fizerem como nós, os “reis anônimos do camarote”, como iremos ostentar? Para eles, não terá mais graça ter um Camaro amarelo ou uma Ferrari vermelha! Pois imaginem gastar tanta grana para mostrar o quanto de dinheiro possui e ainda ser confundido com “eles”, os pobres-ricos, não é? E é aí que eu me refiro. Que grande cartada da contradição, não é? Os ricos perdem a exclusividade de ostentar, pois os mais pobres estão entrando na área VIP e levando com eles a fama.
O fenômeno da ostentação por parte dos mais pobres é um absurdo? Só para os que pensam como os ricos. Afinal, se “eles” fizerem como nós, os “reis anônimos do camarote”, como iremos ostentar? Para eles, não terá mais graça ter um Camaro amarelo ou uma Ferrari vermelha! Pois imaginem gastar tanta grana para mostrar o quanto de dinheiro possui e ainda ser confundido com “eles”, os pobres-ricos, não é? E é aí que eu me refiro. Que grande cartada da contradição, não é? Os ricos perdem a exclusividade de ostentar, pois os mais pobres estão entrando na área VIP e levando com eles a fama.
O
que é mais contraditório na educação dos seus filhos: Proibir que escutem o
Funk cheio de sexo, traição e ostentação ou assistir junto com eles um programa
de família, a novela das oito? Pois a novela é beeem diferente (#Sóquenão). Enredos
cheios de traição, sexo e sim, ostentação. Boa questão, não é? Não quero ser
entendido como moralista, acho que a novela revela boas questões, assim como o
Funk Ostentação, mas em muitas questões, não vejo grandes diferenças. Me
desculpem os Globais, ok?
http://f5.folha.uol.com.br/colunistas/ricardofeltrin/950718-contra-a-fazenda-globo-poe-todo-elenco-de-o-astro-para-fazer-sexo.shtml
http://f5.folha.uol.com.br/colunistas/ricardofeltrin/950718-contra-a-fazenda-globo-poe-todo-elenco-de-o-astro-para-fazer-sexo.shtml
Mas
se a ostentação está em quase tudo, qual o problema de estar no Funk? Bom, aí
voltamos a um argumento comum na cabeça do brasileiro. Para ser rico tem que
merecer. Como é possível alguém “deles”, com pouca idade, ser mais rico que meu
pai? Como é possível que “eles” queiram estar no Shopping? Que possam comprar
as mesmas roupas, marcas e estilos que “nós” os ricos e exclusivos na aparência?
Não
sei se é uma crise de personalidade das classes abastadas, eu não chegaria tão
longe fazendo previsões assim. Mas digo que a ostentação está tanto na sua
televisão, quanto na sua música, nas propagandas, nos filmes. E todos deverão
descobrir em breve que a desigualdade do Brasil está sim nas periferias, mas
também no seu shopping, na sua faculdade, no seu rádio, na sua televisão e na sua revista. Ostentação
e desigualdade andam juntas meu caro. Talvez seja mesmo insuportável que um
ex-miserável possa ostentar agora. É Zagallo, essa vocês terão que engolir,
todo o dia e toda a hora. Você só conseguirá ficar longe dessa tensão em sua
casa, ou seria o seu quarto, ou seu armário ou mesmo seu banheiro?
Não gostou de saber de
tudo isso? Ofende saber que você também faz parte disso, consome e gosta disso?
Você responderia: Mas eu não ostento! E eu responderia: Mas consome a
ostentação por quase todos os lados, ela está lá, mesmo que você não tenha
parado para ver. Você aplaude as fortunas e os grandes gastos individuais, bate
foto de carro importado e sonha em ganhar seu milhão, mas é na verdade um cidadão
médio. Mas pensa como rico, vota como rico e acaba por viver a constante
contradição. A culpa de tudo isso, dos políticos, claro. Seus filhos continuarão
a escutar de você o seu preconceito, “que música terrível”, “que linguagem
chula" você diz, mas Anita tocará no aniversário da sua filha hahahaha, essa
pode, pois é como a novela, politicamente incorreta.
Gostaria
de te convidar então para assumir publicamente: Eu ostento a ostentação. Fale também para seus amigos e familiares: Eu ostento a ostentação com vocês. Pronto!
Agora será bem vindo ao clube da contradição. Julgar “eles” é fácil, mas ser
parte da sua própria crítica irrita, né? #TensoMesmoÉviverAsuaContradição.
ID!
Ivan Dourado é Antropólogo e professor Universitário